26 de outubro de 2011

Sobre "Frente e Verso"

Eu sempre gostei muito de ler. Quando eu era mais nova, meu pai me dava livros infanto-juvenis aos montes. Li muita mitologia afro brasileira, principalmente, mas li muitas outras coisas recomendadas por ele, como "O estranho caso do cachorro morto", escrito por Mark Haddon, que até hoje é um dos meus livros favoritos e foi o motivador do meu interesse por autismo, interesse esse cultivado até hoje.
Aos poucos, quando eu tinha por volta de 12 ou 13 anos, comecei a me interessar por romances voltados para meninas da minha idade e aos 14 anos eu tinha lido todos os livros lançados em português da Meg Cabot e mais alguns de outras autoras com linguagem semelhante.
Tudo isso só pra deixar claro o quanto eu sempre gostei de ler. Simultaneamente à minha época devoradora de livros da Meg Cabot, comecei também a escrever minhas próprias histórias, nas quais eu colocava nas minhas personagens tudo aquilo que eu desejava ser e em suas aventuras tudo aquilo que eu gostaria de realizar na minha vida.


Aos poucos, os livros que antes me encantavam tanto passaram a não ser mais tão atrativos pra mim e eu quis encontrar histórias mais condizentes com a minha nova realidade, histórias um pouco menos pré adolescentes. Assim, procurando na internet, vi uma recomendação do livro "A rosa do inverno", da Meg Cabot sob o pseudônimo de Patricia Cabot, que era um livro mais adulto, uma outra faceta da minha autora favorita. Foi o primeiro livro com conteúdo quase erótico que acabei lendo, e me encantei. A sutileza das palavras e a realidade que aquelas páginas transmitiam pra mim era incrível.
Esse ano, pela primeira vez, li um livro com temática lésbica. Comecei primeiro lendo o blog Fucking Mia, recomendado por uma amiga, e me encantei por ele. Li o blog inteiro em pouquíssimo tempo e até hoje leio sempre as atualizações. No meio das minhas leituras virtuais e de pesquisas sobre homossexualidade e afins na internet, acabei chegando a outras autoras e comprei o livro da Diedra Roiz, “O livro secreto das mentiras e medos”, que devorei de uma forma absurda. Adorei o livro, fiquei inconformada que ele acabou, queria que tivesse uma continuação... E precisava desesperadamente de alguém para compartilhar meu encantamento, então o emprestei para a minha namorada que também devorou o livro e também gostou tanto quanto eu.


Depois dessa descoberta incrível, eu queria muito achar outros livros com temática lésbica para ler e cheguei ao site da Editora Malagueta, que só publica livros de autoras lésbicas com temática lésbica. Fui então procurar os livros na Livraria Cultura (o que me rendeu um momento de raiva, pois os livros LGBT estão numa estante minúscula ao lado dos livros de erotismo e não tem nenhuma placa indicando que ali é a sessão LGBT da livraria, mas isso talvez renda outro post...) e me empolguei xeretando por lá, apesar de não ter comprado nada.
Com muitas coisas que andaram acontecendo, eu fui cada vez mais diminuindo minha freqüência de escrita. Parei de escrever inclusive para mim mesma, entrei num período de bloqueio que não tinha idéias para meus blogs, não conseguia elaborar textos que me satisfizessem e minha namorada vivia me dizendo que eu deveria voltar a escrever, que ela sentia falta disso em mim e coisas assim.
Então, um professor meu da faculdade passou um trabalho sobre assuntos polêmicos e eu rapidamente tomei conta do tema “Direitos sexuais e tolerância” e comecei a pesquisar no mesmo dia que ele passou o trabalho. Nessa mesma semana, minha namorada apareceu na minha casa com um livro da Editora Malagueta, que era lançamento, o livro “Frente e verso – visões da lesbianidade”, composto por artigos de Lúcia Facco, Laura Bacellar e Hanna Korich sobre o universo homossexual, questões engraçadas, história da literatura lésbica, questões atuais, preconceito, auto-aceitação, entre outros.
Para explicar o impacto desse livro na minha vida, vou dizer o seguinte: tudo isso que escrevi até agora foi só para chegar nesse livro. Já faz algum tempo que terminei de ler e inclusive já emprestei para uma amiga que gostou tanto dele quanto eu. Além da forma amigável e, ao mesmo tempo, séria de escrever, as autoras discutem questões importantíssimas e também questões curiosas e trazem informações relevantes para todas as pessoas, não apenas as lésbicas. Elas abordam temas como as lésbicas que se assumem apenas virtualmente, sobre as lésbicas no cinema e nas novelas, sobre as principais autoras da literatura lésbica, sobre preconceito e religiosidade, sobre a visão errônea que muitas pessoas têm dos homossexuais como pervertidos, sobre homofobia internalizada, sobre a forma como as lésbicas se vestem, as questões familiares, sobre as origens do termo ‘lésbica’, sobre as questões legais como união homoafetiva e união civil homossexual... É tanto assunto que eu, tentando dar um panorama geral, acabei falando um monte de coisa. Tudo isso pra dizer que vale a pena.

O livro não só me ajudou no desenvolvimento do meu trabalho para a faculdade como também foi o meu salvador. Foi ele que me motivou a voltar a escrever, foi ele que me tirou daquele bloqueio horrível que estava acabando comigo e, devo dizer, estou me sentindo incrivelmente melhor de ter conseguido voltar a escrever, por mais bobos que meus assuntos possam ser.
Acho que o livro é de extrema utilidade para qualquer um, mas o último texto, sobre homofobia, foi um texto que me tocou especialmente. Nem quero falar sobre ele aqui, porque ele já me rendeu um texto aqui e também já me rendeu uma boa reflexão pessoal. Além disso, se alguém ler esse meu post eu espero que essa pessoa fique um pouquinho curiosa e vá procurar o livro porque, acreditem, vale muito a pena.

Lúcia Facco, Laura Bacellar, Hanna Korich e minha namorada, meu amor lindo, muito obrigada por esse presente na minha vida.

PS.: por recomendação de um dos artigos do livro, estou lendo um livro incrível da Cassandra Rios, quando eu terminá-lo posso escrever alguma coisa por aqui.


Imagens: Tumblr.

21 de outubro de 2011

Enquanto ela está fora

Hey There Delilah

Plain White T's

 Hey there Delilah
what's it like in New York city
I'm a thousand miles away
but girl tonight you look so pretty
yes you do
time square can't shine as bright as you
I swear it's true

Hey there Delilah
don't you worry about the distance
I'm right there if you get lonely
give this song another listen
close your eyes
listen to my voice it's my disguise
I'm by your side

Oh it's what you do to me
Oh it's what you do to me
Oh it's what you do to me
Oh it's what you do to me
what you do to me

Hey there Delilah
I know times are gettin hard
but just believe me girl
someday i'll pay the bills with this guitar
we'll have it good
we'll have the life we knew we would
my word is good

Hey there Delilah
I've got so much left to say
if every simple song i wrote to you
would take your breath away
I'd write it all
even more in love with me you'd fall
we'd have it all

Oh it's what you do to me
Oh it's what you do to me
Oh it's what you do to me
Oh it's what you do to me

A thousand miles seems pretty far
but they've got planes and trains and cars
I'd walk to you if I had no other way
our friends would all make fun of us
and we'll just laugh along because we know
that none of them have felt this way
Delilah I can promise you
that by the time that we get through
the world will never ever be the same
and you're to blame

Hey there Delilah
you be good and don't you miss me
two more years and you'll be done with school
and I'll be makin' history like I do
you know it's all because of you
we can do whatever we want to
Hey there Delilah here's to you
this one's for you

Oh it's what you do to me
Oh it's what you do to me
Oh it's what you do to me
Oh it's what you do to me
what you do to me




Tradução
 Hey Dalila,
Como está ai em New York?
Eu estou a mil milhas longe daí
Mas menina hoje você está tão bonita,
Sim você está
Time Square não consegue brilhar tanto quanto você
Eu juro que é verdade

Hey Dalila,
Não se preocupe com a distância
Eu estou lá se você se sentir sozinha
Ouça essa música mais uma vez
Feche seus olhos
Escute minha voz, é meu disfarce
Eu estou ao teu lado

Oh é o que você faz comigo
Oh é o que você faz comigo
Oh é o que você faz comigo
Oh é o que você faz comigo
O que você faz comigo

Hey Dalila,
Eu sei que os tempos estão se tornando difíceis
Mas acredite em mim menina
Algum dia eu pagarei as contas com esse violão
Nós teremos isto
Nós teremos a vida que sabíamos que teríamos
Minha palavra é de confiança

Hey Dalila,
Eu ainda tenho tanto pra falar
Se cada simples música que eu escrevi pra você
Pudesse tirar seu fôlego
Eu escreveria todas elas
E ainda mais apaixonada por mim você ficaria
Nós teríamos tudo

Oh é o que você faz comigo
Oh é o que você faz comigo
Oh é o que você faz comigo
Oh é o que você faz comigo

Mil milhas parecem muito longe
Mas eles tem aviões e trens e carros
Eu andaria até você se não tivesse outro jeito
Nossos amigos iriam rir de nós
E nós vamos rir junto porque nós sabemos
Que nenhum deles nunca se sentiu assim
Dalila, eu posso te prometer
Que quando passarmos por tudo
O mundo nunca mais será o mesmo
E você é a responsável

Hey Dalila,
Seja boa e não sinta minha falta
Mais dois anos e você vai ter terminado a escola
E eu estarei fazendo história como eu faço
Você saberá que tudo é só por sua causa
Nós podemos fazer o que quisermos
Hey Dalila, aqui está pra você
Esta é pra você

Oh é o que você faz comigo
Oh é o que você faz comigo
Oh é o que você faz comigo
Oh é o que você faz comigo
O que você faz comigo

(vídeo cover da música que eu gostei bastante)



(achei que era importante ter uma mulher cantando, apesar e não ter gostado muito desse cover :/)

11 de outubro de 2011

As vantagens de namorar uma mulher

Este post foi, como o anterior, motivado pela leitura do livro "Frente e verso - visões da lesbianidade", especialmente pelo capítulo "A vantagem de ser lésbica", escrito por Hanna Korich.

Quando terminei de ler o capítulo do livro, fiquei pensando: e não é que existem milhões de vantagens em namorar uma mulher?
Não foram poucas as vezes que vi amigas minhas com os olhinhos brilhando me ouvindo contar de alguma surpresa que fiz para minha namorada ou que ela fez para mim. Muitas amigas minhas, héteros, já disseram, brincando, que vão virar lésbicas porque as mulheres são muito fofas a atenciosas.
Como eu definitivamente não tenho experiência para usar como referência, só posso dizer do modo como eu me porto com a minha namorada e como ela se porta comigo e de como são os casais de mulheres com os quais convivemos e, observando essas referências, eu posso dizer sem dúvidas que as mulheres são mesmo muito românticas.
Namorando uma mulher, você pode escrever cartinhas melosas, dar flores ou um bichinho de pelúcia sem medo de que seja muito "gay" e, mais bacana ainda do que isso: as chances de você ganhar todas essas coisas são ainda maiores!
Além disso, mulher entende de coisa de mulher. Isso significa que a chance de a sua namorada acertar no presente é muito maior do que a chance de um homem acertar. Sem contar que, por serem duas mulheres se relacionando, vai haver uma facilidade maior de entender as TPMs, as crises tipicamente femininas de ciúmes, as delicadezas de cada uma, as incertezas, os desejos.
Com uma mulher, você pode compartilhar suas intimidades sem ter vergonha porque ela não vai entender. Uma mulher nunca vai te desrespeitar por ser mulher, afinal, ela também é uma, não?
As vantagens são muitas e tenho certeza de que cada mulher vai saber citar outras vantagens que ela considera. O relacionamento entre mulheres, para mim, parece muito mais intenso, sentimental e profundo do que o relacionamento entre homem e mulher.
Talvez seja um pouco de heterofobia da minha parte, mas depois que passei a me relacionar com mulheres, frequentemente eu vejo um casal homossexual como mais apaixonado do que um casal heterossexual.
Mulheres são delicadas, atensiosas, compreensivas, companheiras, românticas, cuidadosas... que mulher não sonha com alguém assim na vida?
Pois é...

Homofobia

Posso dizer que, nos meus poucos meses realmente assumida - andando na rua de mãos dadas, falando normalmente da minha namorada para os meus amigos, etc - eu nunca sofri nenhum tipo de preconceito por gostar de outra mulher. Minha namorada também nunca me contou nenhuma situação que tenha vivido e as amigas que temos também nunca mencionaram nada. Assim, fica fácil idealizar que não existe preconceito nenhum, que o mundo está melhorando, que as pessoas estão aprendendo a aceitar os homossexuais e que tudo caminha às mil maravilhas... mas não é assim.
Poucos dias atrás, eu me dei conta da sorte que tenho. Me dei conta de que, apesar de ter sofrido no início e ter sido difícil, eu tenho uma família incrível. Uma irmã que não só aceitou super bem o fato de eu ficar com mulheres como quase não conseguiu entender porquê eu fiz tanto drama para comunicá-la. Tenho uma mãe que, apesar de ter ficado triste e reagido bem mal no começo, hoje já me aceitou e já consegue lidar naturalmente com a presença da minha namorada em casa e com as minhas noites passadas fora com ela. Tenho um pai que está no processo de aceitação e que, apesar de ainda não ter conseguido entender completamente, pelo menos eu sei que me ama e que está tentando deixar esse incômodo passar.
Além disso, eu vivo em um ambiente privilegiado. Meus amigos, colegas, professores, médicos, enfim, as pessoas que eu tenho contato no dia-a-dia, são pessoas esclarecidas que, por mais que não concordem, entendem a importância do respeito ao outro e nunca me falaram nenhuma palavra ofensiva. Nem mesmo uma colega evangélica que eu tenho na faculdade que me disse com todas as letras que acha que o relacionamento entre pessoas do mesmo sexo é pecado e que ela não acha certo, me disse uma palavra ofensiva. Muito pelo contrário, ela me disse que não concordava com o meu modo de vida mas que me respeitava, à medida que eu também lhe devo respeito.
Convivendo com pessoas e familiares assim, não é difícil de entender que às vezes eu chegue a quase acreditar que a homofobia está se extinguindo, mas, no fundo, eu sei que ela não está. Eu sei porque eu leio, porque vejo notícias na internet, porque ouço sobre os crimes homofóbicos que continuam acontecendo na minha própria cidade, nos lugares que eu costumo frequentar constantemente.
Acho que é muito fácil dizer que nada está acontecendo quando ninguém está mexendo no seu quintal. Enquanto eu estiver segura, enquanto eu não me sentir ameaçada por andar de mãos dadas com a minha namorada na rua, enquanto eu não tiver medo de sofrer violência física ou psicológica, é muito tranquilo para mim ficar quieta e achar que a homofobia está acabando.
O discurso cada vez mais frequente contra a homofobia e as discussões cada vez mais acaloradas e mais presentes na mídia a respeito dos direitos dos homossexuais dão a falsa impressão de que o preconceito está deixando de existir, mas ainda existem muitas crianças e adolescentes que sofrem bullying por serem homossexuais, ainda existem gays e lésbicas que se suicidam por acreditarem que são uma aberração ou por não aguentarem a discriminação que sofrem, ainda existem mães que expulsam seus filhos de casa pela "escolha" pecaminosa que eles fizeram para suas vidas.
A homofobia não só existe como contribui para a ignorância a respeito da homossexualidade. Enquanto ainda houver esse preconceito, os professores não vão ensinar as crianças como se proteger numa relação homossexual nas aulas de educação sexual que eu tenho certeza que existem em praticamente todas as escolas. Enquanto existir homofobia, a questão da homossexualidade, o que ela é e de onde ela vem não será esclarecida e continuarão a existir pessoas que acreditam que a homossexualidade é uma doença, um distúrbio, uma anormalidade ou uma opção. Enquanto pessoas forem discriminadas por sua orientação sexual, continuarão a existir muitos sofredores, que acreditam que foram condenados a viver em pecado e que nunca conseguirão assumir sua homossexualidade nem mesmo para si mesmo, quem dirá para os outros.
Acho que já passou da hora das instituições sociais olharem para a homofobia da forma como deve ser, de incluírem o assunto nas escolas, nos debates, nas novelas, nos comerciais. Já passou da hora das famílias homossexuais e heterossexuais conviverem normalmente e as crianças considerarem normal ter coleguinhas na escola que tem dois pais, outros que tem duas mães e outros que tem um pai e uma mãe (além dos outros tipos de famílias de mães/pais solteiros, etc).
Considero válido citar aqui o comercial de um jornal, se não me engano, no qual o filho está sentado no banco de trás do carro e seu pai está dirigindo o carro, quando o menino diz algo como: "Pai, na minha escola tem um menino que tem dois pais. Isso quer dizer que tem algum menino por aí que tem duas mães, né?". Acho bonito o comercial, pois mostra esse mundo ideal que eu gostaria que nós vivêssemos atualmente. Um mundo no qual ser homossexual ou ser heterossexual não seja uma grande diferença entre as pessoas. Um mundo no qual uma criança faça esse tipo de pergunta pela sua inocência e inexperiência de criança, sem achar estranho o fato de ter um coleguinha com dois pais. Um mundo no qual eu seja vista por ser eu mesma, oras sendo vista pela minha profissão, oras por ser a filha da Fulana ou a amiga do Ciclano, mas nunca exclusivamente por ser aquela lésbica X. Ser homossexual é apenas uma faceta de nossas vidas. Ou será que alguém acha que ser pai, filho, irmão, colega, chefe, empregado, proprietário, etc, é a única coisa que alguém pode ser na vida? Todas as pessoas são mil coisas simultaneamentes e sua sexualidade é apenas uma dessas coisas, que não deve ter mais ou menos importância do que todo o resto.




Um agradecimento especial à Lúcia Facco, por seu texto "A homofobia acabou?", no livro "Frente e verso - visões da lesbianidade", que foi o motivador deste post.